Por Professor Marcos Vicente
Com a pandemia que nos assola no momento, surgiram pessoas otimistas que defendem uma mudança radical e para melhor da forma de viver e de se relacionar dos seres humanos, por conta das necessidades que virão. A tese defende que teremos um comportamento mais humanitário, socialmente preocupado consigo próprio e com o outro, além de passarmos a viver dentro de um mundo menos manufaturado e mais tecnológico.
Não acredito nessa nova teoria!
O que a história, a geologia, a biologia, a física, enfim
as ciências em geral nos contam, é que os seres humanos possuem sim a capacidade
de se adaptar ao meio, e que seria esse o grande segredo de sua prosperidade
enquanto espécie. Contudo também nos contam que tais mudanças estão intimamente
vinculadas à necessidade. Assim, a mudança somente acontece quando o ser humano
pretende evitar uma consequência da não adaptação ou quando ele é obrigado.
Evitar uma consequência seria, por exemplo, evitar a sua
morte sob sofrimento (não acredito que as pessoas tenham medo de morrer, mas
sim medo do sofrimento que a antecede); ou evitar a morte de um ente querido,
que lhe fará falta sentimental.
Nesse caso a teoria parece não se
aplicar, de um lado porque outras pandemias já vivenciadas não se mostraram
capazes de impingir o sofrimento da morte ao subjetivo, caso contrario já
viveríamos o suposto novo. E, de outro lado, porque a humanidade vem mostrando
que o sofrimento de perda do outro dura somente até que o vazio seja
substituído. O foco não era e nunca foi o outro, mas sim o vazio que ele deixou
no sujeito.
Desacredito na nova normalidade porque acredito que os
seres humanos estão preocupados unicamente com o “eu”, que por definição é
“super” potente e imbatível, e porque seus vazios sucumbem à memoria ou se
deleitam na transferência de afeto.
Já sob a ótica da obrigação é importante perceber que uma
obrigação sem punição é o mesmo que um avião sem asas, não serve para nada.
A obrigação de se enquadrar na tese da nova normalidade
poderia advir das escolas, que no momento não podem exercer o seu papel na
educação formal, pelo que não podemos contar muito com elas. Poderia vir da
família, essa que hoje tem muito tempo disponível para atuar na educação de
base, ou ainda do Estado através de politicas públicas voltadas a atenção
social e sanitária.
Já que não podemos contar com a escola formal na cunhagem
desse novo normal, vamos à família. A família pode e acredito que irá
contribuir. Nesse ponto as crianças serão verdadeiros algozes dos erros e
levarão a mensagem, recebida da fala de seus próprios pais, desse novo normal
provocando, implicando, cobrando as condutas moldadas como sendo certas. Só que
as crianças são o futuro e novo normal talvez seja esquecido com o
amadurecimento. Quanto ao presente, desculpe! “Papai” não pode dar atenção para
isso agora.
Só nos resta contar com a obrigação oriunda do Estado.
Até então “deitado eternamente em berço esplendido”, não podemos contar com o
Estado a nos obrigar a manter uma conduta socialmente melhor e preocupada com o
outro. O Estado mostra-se um gigante fraco, indolente e corrupto. Ele merece
mais um,de tantos outros, tratados sobre ele escritos para que seja possível
demonstrar a justificável desesperança no mesmo.
A pandemia não irá mudar o mundo? A tecnologia não é uma
boa coisa?
A migração para um mundo tecnológico parece sim ser
inevitável, as pessoas estão se acostumando a viver na web, em virtude da
obrigação do confinamento. Não devemos nos aglomerar presencialmente, não
devemos frequentar restaurantes, festinhas, aniversários ou casamentos. Tudo
agora acontece através da janela maravilhosa da internet. Até consultas médicas
estão sendo realizadas através da internet, para que se evite o contato social
nos já lotados hospitais.
O novo normal será marcado, ainda mais do que já é
atualmente, pela presença dos computadores, smartphones, tabletes e todas as
tecnologias da WWW. As coisas, as informações e as pessoas estarão mais perto,
e ao alcance dos dedos. Até os mais idosos que até pouco tempo olhavam a
tecnologia com incredulidade e certa aversão, já estão se acostumando com o novo.As janelas e as maças mordidas estarão presentes no novo
normal e isso será mais uma tragédia humanitária.
A sociedade, de forma mais ou menos intensa em
determinadas localidades, é marcada pela diferença. Não que a diferença seja um
problema, até porque é ela que nos entrega a qualidade de seres humanos. O
problema é a segregação que se origina no olhar torto que se coloca sobre a
diferença.
A segregação reside entre gêneros diferentes, entre
etnias diferentes, entre orientações sexuais diferentes, entre ritos religiosos
diferentes...enfim entre todos os diferentes.
Assim, o mergulho em um mundo mais tecnológico trará mais
uma forma de segregação, aquela entre aqueles que podem abrir as janelas ou
morder a maçã e aqueles que não terão essa possibilidade.
Estais louco, podem dizer alguns diante da profecia que a
tecnologia será um motivo de segregação, não consegues perceber que telefones
podem ser comprados com um custo baixo ou financiados por meses a fio, sem que
isso comprometa mesmo o mais acanhado orçamento?
Respondo que têm pessoas que não possuem orçamento,
pessoas que não tem o que comer, pessoas que estão abaixo da linha pobreza e
que, inclusive, já são segregadas por isso e serão ainda mais pela falta de
acesso à tecnologia.
Lembro que os computadores, smartphones e tabletes servem
de muito pouco sem acesso a internet, que por sua vez é cara e mal fornecida.
Já perceberam que algumas lives,
inclusive de famosos “travam”. Será que todos terão acesso a essa rede, ainda
que precária?
Não prego o final da tecnologia (gosto e preciso dela),
mas gostaria de viver em um mundo mais igualitário. O problema é estrutural e
de base. Enquanto existir esse vale entre aqueles que podem e aqueles que não
podem, qualquer coisa será motivo de segregação.
Homens segregam mulheres, porque acham que podem mais...
Brancos segregam negros, porque acham que podem mais...
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